Aprovado por uma comissão especial na Câmara dos Deputados nas primeiras horas desta quinta-feira (10/8), o "distritão" para eleições legislativas não reduzirá os custos eleitorais, como era esperado da reforma política. A opinião é de eleitoralistas consultados pela ConJur.
Segundo eles, isso acontece porque, apesar de não haver quociente eleitoral, as campanhas continuarão sendo feitas por todo o estado, sem subdivisões regionais.
O modelo de votação foi aprovado por 17 votos favoráveis contra 15 contrários na comissão especial que analisa a reforma política. Esse tema não estava no texto original apresentado pelo relator da proposta, deputado Vicente Candido (PT-SP), mas foi incluído pelo PMDB como destaque e contou com o apoio de PSDB, DEM, PP e PSD.
Caso o texto seja confirmado pelo Plenário — o presidente da Casa, Rodrigo Maia, quer votar o tema na semana que vem —, as alterações já valerão para as eleições do ano que vem e para o pleito de 2020. A partir de 2022, o sistema mudará para distrital misto. Nesse modelo, metade dos legisladores federais, estaduais e municipais será escolhida por meio de listas, e os outros 50%, pelo voto majoritário distrital.
Em entrevista à ConJur, o eleitoralista André Lemos Jorge adiantou que o modelo a ser usado nas próximas duas eleições será o distritão. “Vai ser distritão! Pode publicar que em 2018 a eleição terá distritão e fundo eleitoral”, disse, alertando que o modelo será caro e reduzirá o número de candidatos.
“Com o distritão, a eleição em São Paulo, por exemplo, funcionará assim: os 70 deputados federais mais votados serão eleitos. Isso não vai diminuir os custos da eleição. Vão gastar rios de dinheiro para fazer campanha em todo o estado, mas apostando em menos candidatos. Cada partido vai colocar aqueles dois ou três deputados que podem fazer mais de 100 mil votos”, explicou.
Segundo Renato Ribeiro de Almeida, membro da Academia Brasileira de Direito Político e Eleitoral e da Comissão de Direito Eleitoral da OAB-SP, essa mudança é o “pior que poderia acontecer para a democracia brasileira”. Ele diz que, apesar de ter um discurso sedutor, por causa da expectativa pelo fim dos “puxadores” de voto, o modelo aprovado “esconde uma sorrateira e astuta estratégia”, que é a manutenção da atual classe política.
O distritão, continuou, também pode esvaziar os partidos políticos e inviabilizar novas lideranças políticas. “Ao eleger quem tem mais votos individualmente, sem a ajuda dos votos dos demais do partido, quem já está no poder tem vantagem. Ele goza de cargo, visibilidade, assessores e verbas para se fazer ainda mais conhecido, ter mais projeção para se reeleger. Como um cidadão comum vai competir assim?”
O advogado questiona se, em 45 dias de campanha, um desconhecido conseguirá se mostrar para os eleitores no mesmo nível que um “deputado que teve quatro anos para trabalhar a própria reeleição”. “Nesse caso, mais e mais Tiriricas ocuparão o Congresso Nacional. Os partidos procurarão candidatos 'puxadores de votos' que consigam se eleger sozinhos.”
Lemos Jorge discordou nesse ponto. Para ele, a mudança eliminará os candidatos que só eram chamados pelas siglas para puxar votos. “Elimina os candidatos fake, mas o dinheiro que os partidos não vão gastar com esses vai ser usado para fazer a campanha dos candidatões.”
Em tom mais conciliador, o procurador da República André de Carvalho Ramosafirmou que todos os sistemas eleitorais têm prós e contras. Também em entrevista à ConJur, ele explicou que o ponto principal é saber se a sociedade está pronta para a mudança.
"A mudança vai exigir, possivelmente, uma constituinte exclusiva. A depender do sistema, o número de partidos tende a diminuir. Aquele voto distrital clássico leva a uma diminuição abrupta do número de partidos", opinou.
Leandro Mello Frota destaca que, independente do modelo de votação, é preciso haver liberdade de financiamento. "Sem financiamento empresarial, como um candidato novo vai viabilizar a campanha? Ele vai ter que sentar com o presidente do partido e mostrar que tem capacidade para ser eleito. E é aí que está o problema, pois há uma falta grande de transparência no modelo de escolha de candidatos pelos partidos", diz.
Ele explica que novos atores que ingressarem na política terão dificuldades com o "distritão", pois leva um certo tempo até que o nome seja conhecido dos eleitores, mas ressalta que os caciques partidários que não conseguem votações expressivas também sentirão esse efeito. "Eles detém a máquina partidária, mas não os votos", complementa.
Fundo de campanha
O texto aprovado pela comissão especial também cria o Fundo Especial de Financiamento da Democracia, que contará com 0,5% das receitas correntes líquidas do orçamento. Atualmente, esse montante corresponde a cerca de R$ 3,5 bilhões. A proposta também determina que caberá ao diretório nacional do partido definir, 30 dias antes da escolha dos candidatos, como serão divididos os recursos para o custeio das eleições.
Outra alteração aprovada na comissão especial foi a manutenção dos cargos de vice para presidente, governador e prefeito. A ideia original era extinguir esses cargos. O argumento usado foi a redução de custos e a linha sucessória existente, que serviria para ocupar o posto em caso de vacância.
Coligações partidárias
Em outra comissão especial, que analisa novas regras sobre a coligações partidárias, a relatora do texto a ser votado, deputada Shéridan (PSDB-RR), apresentou, nesta quinta-feira, parecer favorável à Proposta de Emenda à Constituição 282/16 do Senado em forma de substitutivo. Mas a votação foi adiada para a próxima quinta-feira (17/8) porque os parlamentares do colegiado pediram vista conjunta.
O texto apresentado pela deputada proíbe as coligações nas eleições proporcionais (deputado e vereador) a partir de 2020 e impõe regras para que os partidos tenham acesso ao dinheiro do Fundo Partidário e à propaganda gratuita na rádio e na TV.
Se as mudanças forem aprovadas, os partidos que terão acesso a esses benefícios serão os que obtiverem, nas eleições para a Câmara dos Deputados:
na legislatura seguinte às eleições 2018: 1,5% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos nove estados, com no mínimo 1% de votos válidos em cada um deles; ou tiverem elegido pelo menos nove deputados distribuídos em nove estados;na legislatura seguinte às eleições de 2022: 2% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos nove estados, com no mínimo 1% de votos válidos em cada um deles; ou tiverem elegido pelo menos 12 deputados distribuídos em pelo menos nove estados;na legislatura seguinte às eleições de 2026: 2,5% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos nove estados, com no mínimo 1,5% dos votos válidos em cada um deles; ou tiverem elegido pelo menos 15 deputados distribuídos em nove estados;na legislatura seguinte às eleições de 2030: 3% dos votos válidos, distribuídos em pelo menos nove estados, com no mínimo 2% dos votos válidos em cada um deles; ou tiverem elegido pelo menos 18 deputados distribuídos em nove estados.
Pelo texto original, só teria acesso ao fundo e ao tempo de rádio e TV a legenda que, em 2018, garantisse 2% dos votos válidos nas eleições para a Câmara em pelo menos 14 estados, com 2% de votos válidos em cada um deles. A partir de 2020, o corte subiria para 3% dos votos em 14 estados.
Shéridan justificou que a proposta do Senado fazia uma “transição muito abrupta”. Disse também que o substitutivo poderá reduzir a quantidade excessiva de partidos políticos no Congresso Nacional, caindo de 35 para 18.
A Lei 9.096/95 já tinha condicionado o direito dos partidos a funcionamento parlamentar ao atendimento de cláusula de desempenho, mas o Supremo Tribunal Federal declarou esse artigo inconstitucional em 2006. Agora, os parlamentares optam por tratar o tema em uma proposta de emenda à Constituição.
Conforme a proposta, os partidos que não atingirem a cláusula de desempenho poderão formar federações para ter direito ao funcionamento parlamentar, atuando com uma única identidade política.
"Agência Câmara"
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