sábado, 2 de maio de 2020

Supremo passa a admitir Habeas Corpus contra ato de ministro da Corte

O Habeas Corpus é cabível contra ato individual de ministros do Supremo Tribunal Federal. O entendimento foi firmado pelos ministros em julgamento no Plenário Virtual encerado nesta quinta-feira (30/4). Por maioria, os ministros admitiram HC contra atos individuais de seus membros, formando novo precedente, já que havia divergência de opiniões no tribunal sobre o tema.
Até então, o Plenário não teve a oportunidade de aprofundar a discussão presencialmente. Tema gera divergência no tribunal
De acordo com o relator, ministro Marco Aurélio, o HC é cabível contra decisão formalizada por integrante do Supremo, considerando que a súmula 606 "alcança ato de Colegiado, e não individual". 
O HC em análise, procedente de Roraima, foi impetrado contra decisão monocrática da ministra Cármen Lúcia, que havia negado um agravo regimental. O paciente alega que está submetido a constrangimento ilegal pela não apreciação do recurso interposto, havendo risco à liberdade, considerada a certificação do trânsito em julgado da decisão condenatória.
Em seu voto, Marco Aurélio admitiu o HC, rejeitando as preliminares invocadas pela Procuradoria Geral da República. O pedido, contudo, foi negado, pois o ministro vislumbrou "ausência de ilegalidade a ser reparada". De todo modo a simples admissão do HC criou novo entendimento na Corte.
Marco Aurélio foi acompanhado com ressalvas pelos ministro Gilmar Mendes, Dias Toffoli e Luís Roberto Barroso. Toffoli reiterou que seu entendimento pessoal é pelo cabimento do HC contra decisão individual de seus membros. No entanto, Toffoli diz entender a necessidade de impor balizas à medida para evitar "sua utilização indiscriminada" que, além de subverter o sistema recursal, inviabilizaria o funcionamento do STF.
O ministro afirmou ainda que deve ser seguido o disposto no artigo 102, da Constituição Federal, que aponta a competência do STF para processar e julgar HCs nos casos em que "o coator for Tribunal Superior ou quando o coator ou o paciente for autoridade ou funcionário cujos atos estejam sujeitos diretamente à jurisdição do Supremo Tribunal Federal". 
Por sua vez, o ministro Barroso concordou com a negativa do pedido e apontou sua posição "quanto à inadequação da via eleita". Segundo ele, a súmula 606 define o não cabimento de Habeas Corpus contra decisão proferida por ministro ou Turma do Supremo.
A divergência foi aberta pelo ministro Luiz Edson Fachin e seguida por Rosa Weber. Impedida, a ministra Cármen Lúcia não votou.
HC contra acórdão de turma
O Supremo Tribunal Federal tem em sua jurisprudência que "não cabe Habeas Corpus originário para o Tribunal Pleno de decisão de turma, ou do Plenário, proferida em Habeas Corpus". A definição consta da já referida súmula 606 e foi reafirmada em julgamento virtual que também encerrou nesta quinta.
Fachin reafirmou jurisprudência da Corte que não permite HC contra decisão da Turma 
Rosinei Coutinho / SCO STF
No caso em julgamento, o relator do HC, ministro Luiz Edson Fachin, apontou precedentes das turmas da Corte em que foi assentado a admissão do HC apenas em hipóteses excepcionais: "em que a matéria de fundo do Habeas Corpus seja nova em relação aos precedentes da Corte e em que haja pedido de destaque por um dos Ministros quando do julgamento em plenário virtual".
O HC pedia também a possibilidade de sustentação oral nos agravos regimentais. Fachin considerou que, embora tenha havido destaque no julgamento virtual, "a jurisprudência pacífica deste Tribunal não admite a impetração de Habeas Corpus em face de ato praticado por um de seus órgãos". 
Ele foi acompanhado pela maioria dos ministros, com ressalvas apenas do decano, ministro Celso de Mello. Divergiram os ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli.
Idas e vindas
Até então, o Plenário não teve a oportunidade de aprofundar presencialmente a discussão sobre HC contra ato de ministro. Decidiu fazê-lo em sessão virtual, em que o relator inclui voto no sistema e os ministros se manifestam na sequência, sem debate presencial.
Há anos o tema gera divergência no tribunal e a corte teve pontos de inflexão, como mostrou reportagem da ConJur. Em agosto de 2015, assentou que HC é "ação nobre sem qualquer limitação na Constituição Federal" em julgamento que terminou em empate de cinco a cinco. Por consequência, beneficiou o réu. O caso tratava da delação premiada do doleiro Alberto Youssef.
Menos de seis meses depois, por seis a cinco, o STF voltou ao posicionamento anterior sobre a questão, e tornou a não admitir HC contra decisão monocrática de ministro da corte. Para especialistas, as idas e vindas afetam a segurança jurídica e passam um mau exemplo aos magistrados de instâncias inferiores.
Já em 2018, a corte teve novamente a chance de se manifestar em Plenário sobre o tema, em caso que discutia prisão domiciliar a Paulo Maluf. No entanto, a análise ficou prejudicada quando Fachin preferiu conceder HC de ofício para manter a domiciliar por questões humanitárias.
Na ocasião, Toffoli e o ministro Gilmar Mendes se posicionaram a favor do cabimento de HC contra atos de ministros da corte. Gilmar Mendes afirmou, à época, que a corte precisava discutir logo essa matéria. Ele falou que sempre foi a favor do cabimento do HC nesses casos, principalmente pelo o que chamou "uso exorbitante e excessivo" dos poderes monocráticos. "Estado de direito não comporta soberanos", declarou.
Fonte: CONJUR

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