Por 6 votos a 5, os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) considerou necessário o aval do Congresso para a aplicação de medidas restritivas de liberdade contra deputados e senadores pela Corte. A presidente do Supremo, Cármen Lúcia, deu o voto decisivo após empate por 5 a 5.
Após o voto de Cármen Lúcia, os ministros passaram a discutir a extensão das medidas cautelares impostas pelo Supremo que deveriam ser submetidas ao Legislativo.
Em votação que dura mais de dez horas, cinco ministros votaram para que medidas cautelares como o afastamento do mandato de um parlamentar tivesse que passar pelo crivo da respectiva Casa legislativa ou fossem consideradas inaplicáveis. O relator, ministro Edson Fachin, foi acompanhado por quatro colegas no entendimento de que essas decisões judiciais não devem ser submetidas ao aval da Câmara e do Senado.
Veja como foi o voto do relator, Edson Fachin
Penúltimo a votar, o ministro decano Celso de Mello sustentou que o eventual controle parlamentar posterior de determinações do STF seriam "uma clara subversão da ordem constitucional".
"As decisões do STF não estão sujeitas à revisão e nem dependem, para a sua eficácia, de ratificação ou de confirmação por qualquer das Casas do Congresso Nacional [...], sob pena da subversão da ordem constitucional mediante desrespeito frontal ao postulado da separação de Poderes", declarou.
Antes dele, o ministro Marco Aurélio Mello disse entender que não cabe aplicar qualquer medida cautelar prevista no CPP (Código de Processo Penal) a parlamentares.
Antes dele, Gilmar Mendes divergiu parcialmente do voto do relator Edson Fachin e entendeu que não cabe a aplicação de medidas cautelares aos parlamentares. Isso porque a ação pode abrir a possibilidade de se aplicar a prisão provisória aos congressistas, o que não é previsto pela Constituição.
Ricardo Lewandowski entendeu que um parlamentar deve se sujeitar a afastamentos desde que haja fatos concretos que apontem gravidade em investigações de crimes comuns para a continuidade dos trabalhos judiciais. No entanto, a sanção deve ser submetida ao Legislativo para análise em até 24 horas, avaliou.
Por outro lado, Lewandovski acredita que medidas que não impliquem cerceamento da função parlamentar não precisam ser submetidas à respectiva Casa legislativa, como proibição de viagem ao exterior, retenção de passaporte ou comparecimento periódico ao juízo.
Entenda os votos dos ministros:
Fachin (relator): Supremo pode aplicar medidas cautelares, e Congresso não precisa dar aval.
Barroso, Weber e Fux: Acompanharam o voto do relator
Moraes e Marco Aurélio: Supremo não pode aplicar medidas cautelares*
Toffoli: Supremo pode aplicar apenas medidas cautelares que não interfiram no exercício do mandato, salvo em casos de "superlativa excepcionalidade"
Lewandovski: parlamentar deve se submeter a afastamentos, mas com o aval do Legislativo
Mendes: não cabe a aplicação de medidas cautelares aos parlamentares
*Caso sua tese seja derrotada no julgamento, Moraes entende que a respectiva Casa do Congresso Nacional deve se manifestar sobre a medida
O ministro Dias Toffoli também divergiu parcialmente do relator, ministro Edson Fachin, e afirmou que, considerando que a Constituição proíbe a prisão preventiva de parlamentares, veta também as medidas cautelares que possam interferir no exercício do mandato.
Toffoli ponderou, entretanto, que devem ser ressalvadas as situações de "superlativa excepcionalidade". Ele admite a aplicação de algumas medidas cautelares como quebra de sigilo telefônico e bancário, por exemplo.
Não dá para encaixar a realidade em três ou quatro linhas [da Constituição]. Pode surgir uma situação de superlativa excepcionalidade em que eventualmente tenha que se tomar medida cautelar mesmo que não a flagrância
Ministro Dias Toffoli
Para Toffoli, determinar afastamento dos parlamentares, no entanto, estaria fora do alcance do Supremo.
Toffoli afirma que, mesmo em casos excepcionais, a aplicação de medidas cautelares deve ser submetida à respectiva Casa legislativa. O ministro votou contra a aplicação de medidas cautelares que criem interfiram no exercício do mandato, salvo em casos de "superlativa excepcionalidade". Apesar de não ter explicado os critérios que tornariam um caso excepcionalíssimo; Toffoli citou o afastamento do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, determinado por unanimidade pelo plenário do Supremo em maio do ano passado.
Junto ao relator, outros 3 ministros defenderam que essas decisões judiciais --como o afastamento do mandato—não devem ser submetidas ao aval da Câmara e do Senado. O ministro Alexandre de Moraes foi o segundo a votar e divergiu do relator, defendendo que não cabe à Corte sequer determinar essas sanções a parlamentares.
A Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) que está sendo julgada nesta quarta (11) pelo STF foi protocolada em maio do ano passado por três partidos e pede que o eventual afastamento de parlamentares por decisão judicial seja submetido em até 24 horas ao Congresso Nacional, que teria o poder de confirmar ou revogar a medida, como já ocorre nos casos de prisão em flagrante de membros do Legislativo.
A ação foi apresentada dias depois de o Supremo afastar o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) do mandato e, consequentemente, da Presidência da Câmara, por PP, PSC e Solidariedade, que apoiavam o peemedebista.
Colocar a análise da Adin na pauta foi a solução encontrada para diminuir a temperatura da crise aberta entre o STF e o Senado depois que a 1ª Turma do Supremo afastou o senador Aécio Neves (PSDB-MG) do exercício do mandato e determinou o seu recolhimento noturno, há duas semanas.
Caso o Supremo decida que o Congresso tem a prerrogativa de analisar medidas tomadas pelo Judiciário contra parlamentares, o Senado terá aval para reverter em votação prevista para terça-feira (17) a decisão que afastou Aécio Neves do mandato e o impediu de sair à noite.
Como votaram os ministros pró-relator
Em comum, Fachin, Barroso, Weber e Fux entenderam que é preciso estabelecer uma maior igualdade de tratamento a parlamentares perante a sociedade, sem estender a eles privilégios não previstos na Constituição. Para os ministros, a Constituição permite que os deputados e senadores sejam afastados do mandato sem o aval do Congresso e possam sofrer medidas restritivas de direitos, como aconteceu com Aécio Neves.
Uma das argumentações mais ressaltadas nos discursos dos magistrados foi, inclusive, a diferenciação dessas medidas – também chamadas de cautelares – de uma prisão. Eles destacaram que a imunidade parlamentar não os protege de penas como afastamento do mandato e recolhimento domiciliar.
[Restrição noturna] Não interfere na rotina funcional da vida e do trabalho da pessoa. Prisão é prisão. Quem já visitou uma, sabe o que é que é. Medida restritiva de direito é outra coisa
Ministro Barroso
Para justificar o voto e mostrar as penas às quais estão sujeitos, Barroso chegou a exemplificar que um congressista suspeito de agredir uma mulher, pela Lei Maria da Penha, teria obrigatoriamente de manter uma distância mínima da vítima. Ou seja, não se pode conceder benefícios aos parlamentares que não seriam concedidos a cidadãos comuns.
Ao citar o processo de Aécio, Barroso argumentou que o recolhimento noturno impede a pessoa de ir para "baladas, restaurantes, recepções e eventos festivos [...] como se absolutamente nada tivesse acontecido". Ele ainda aproveitou a oportunidade para rebater a hipótese de uma crise entre os Poderes e disse ter recebido diversos senadores em seu gabinete nos últimos dias.
Quanto à prisão, a maioria dos ministros pró-relator concordou que a única medida possível a ser sofrida por um parlamentar é a detenção em caso de flagrante de crime inafiançável. A ministra Rosa Weber lembrou que o fato de haver requisitos suficientes para medidas cautelares – caso em discussão – não significa que a prisão será autorizada.
Barroso, Fux e Rosa foram dois dos três ministros da 1ª Turma que votaram, no fim de setembro, para impor as medidas cautelares contra Aécio. Marco Aurélio Mello e Alexandre de Moraes foram vencidos no julgamento.
Fux disse entender que "a Constituição não diferencia o parlamentar para privilegiá-lo" e defendeu que o fato do político não poder ser preso preventivamente não significa que o Judiciário deve estar submetido a "um estado de inércia". O ministro lembrou que o STF decretou, no ano passado, a prisão do ex-senador Delcídio do Amaral, para rebater argumentos de que um afastamento interfere na representação do Estado.
Relator negou pedido
Fachin, por sua vez, defendeu que eventuais medidas cautelares previstas no CPP (Código de Processo Penal) podem ser aplicadas a parlamentares e não devem ser submetidas ao aval da Câmara e do Senado.
Para o relator, elas são diferentes dos casos de prisão em flagrante, quando a Constituição determina que a Casa legislativa do parlamentar precisa ser consultada. Fachin destacou que há uma diferença "marcante" entre a decretação da perda definitiva do mandato, que só pode ser feita pelo Legislativo, e a suspensão temporária do parlamentar.
O ministro disse considerar a hipótese de o Congresso revisar uma decisão do STF "uma ofensa ao postulado republicano e uma ofensa à independência do Poder Judiciário".
Moraes: flagrante como única hipótese de afastamento
Ao interpretar a Constituição, Alexandre de Moraes foi o segundo a votar e disse que a única hipótese prevista de afastamento cautelar do parlamentar no exercício do mandato é o "flagrante delito por crime inafiançável".
Moraes afirmou ainda que, nos processos de diversas delações premiadas, "restrição noturnas e em feriados, além do regime domiciliar, foram definidas como sanções". Na avaliação do ministro, no entanto, não é porque a "nova roupagem" as chamou de medidas cautelares que não podem ser consideradas formas de prisões.
A decisão de Moraes acolhe parcialmente o pedido dos partidos. O ministro afirmou que, se sua tese for vencida, o seu voto deve ser considerado a favor de que medidas cautelares tenham aval do Congresso em 24 horas, como pede a Adin. Moraes defendeu que a imunidade parlamentar é de "vital importância" porque busca proteger os parlamentares contra o abuso dos demais Poderes.
No entendimento do ministro, as imunidades parlamentares "não podem ser reduzidas, ignoradas, desprezadas ou interpretadas a partir de meras normas ordinárias, invertendo o que é uma garantia do Estado democrático de direito: a interpretação das leis a partir da Constituição e não a interpretação da Constituição".
"Nesse exato momento, [cito] mais ainda a importância dessa Casa do Supremo de se preocupar com o continente, não com o conteúdo, com a importância que existe no Poder Legislativo, em um Congresso Nacional forte numa democracia, e não com o conteúdo", discursou.
Antes de declarar seu voto, o ministro Gilmar Mendes interrompeu a fala de Moraes para dizer imaginar qual será o critério se forem recebidas as denúncias feitas pela PGR (Procuradoria-Geral da República) ao STF se for seguida a decisão da 1ª Turma.
Como exemplo, citou políticos do PP e o ex-presidente da República, hoje senador, Fernando Collor de Mello (PTC-AL), suspeitos de atos ilícitos. "Se formos adotar o critério, todos os parlamentares terão que ser afastados", declarou Gilmar.
Aécio acusa Barroso de não ser imparcial
O advogado do senador Aécio Neves, Alberto Toron, divulgou nota nesta quarta-feira após o voto do ministro Barroso. No texto, ele afirma que o ministro prejulgou caso de Aécio e reafirmou sua culpa, "sem dar a ele a oportunidade sequer de se manifestar e de apresentar provas, ferindo gravemente, assim, o direito de todo cidadão de ser julgado por um juiz imparcial".
"O voto representa verdadeira temeridade, pois desconsidera o contexto obscuro e ilegal no qual as delações envolvendo os executivos da J&F se deram", afirmou Toron no texto.
"UOL"
Nenhum comentário:
Postar um comentário